11 janeiro, 2011

Veja entrevista Keith Richards

Celebrando o lançamento mais aguardado de 2010, o EmTrechos apresenta uma entrevista feita com Keith Rchards para a revista VEJA publicada em 17 de novembro de 2010.
Formalidades a parte, desconsiderem os "senhor" utilizados nessa matéria e entrem na mente de um dos maiores guitarristas de todos os tempos!
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"Sou um sujeito família"

Nos Tempos mais louco do rock, o semanário inglês New Musical Express fez um ranking das personalidades do mundo da música com mais probabilidades de morrer precocemente. Era 1973. Deu Keith Richards, o guitarrista do Rolling Stones, em primeiro lugar. Viciado em heroína, Richards aparecia em público em estado lastimável e dava vexames. Trinta e sete anos depois Keith está vivíssimo. Casado há três décadas com a ex-modelo Patti Hansen e pai de quatro filhos, Richards está "limpo" desde 1977 - embora as marcas dos abusos sejam ainda visíveis - e superou o parceiro Mick Jagger no posto de figura mais popular dos Stones. Se há um músico que tem o que contar em uma autobiografia, por tano, ele. Intitulado Vida, o livro que esta sendo lançado no Brasil obedece ao estilo curto e direto do guitarrista. Richards recebeu VEJA no hotel Le Meurice, em Paris, com seu sorriso largo, seu abraço forte ( ele adora abraçar), o andar cambaleante que inspirou Johnny Depp em piratas do Caribe e a franqueza desconcertante banhada no costumeiro suco de laranja com vodca.

Por que as drogas não o mataram?
Você não é o primeiro a me fazer essa pergunta, nem vai ser o último. O meu médico me faz toda semana. Quando eu morrer e doar meu corpo para a ciência, ela vai ser respondida. Mas a sério, eu sempre tive noção das drogas que estava tomando, e em que quantidade. Eu procurava não extrapolar, por que tinha medo de morrer. E, mesmo que eu tenha passado dos limites uma vez ou outra - e pode ter certeza de que passei -, meu metabolismo é tão forte que suporta os excessos.


Trocar todo o sangue de vez em quando em uma clínica na Suíça ajuda o metabolismo, não?
Ai, lá vem essa história. Eu estava voando de Los Angeles para a Suíça, onde ia me internar para tratar do vício. O avião fez uma escala em Londres e um oficial da imigração me perguntou o que eu pretendia fazer na Suiça. De brincadeira, respondi que iria trocar meu sangue. A declaração foi parar nos jornais e hoje todo mundo acha que é verdade. Mas que motivo eu teria para trocar esse meu sangue, que passou por tantos testes de sobrevivência?


Talvez para se livrar dos problemas que a droga traz.
Bem,nunca tive problemas com drogas. Meus problemas foram sempre com a polícia, que insistia em me revistar e me prender. Usei heroína para fugir dos problemas causados pela fama. Minha via pessoal era exposta todo dia pelos jornais e achei que a droga fosse me dar uma certa privacidade. uma bobagem, claro. Por outro lado, penso o seguinte: "É meu corpo, meu templo e sou a única pessoa que vai pagar pelo meu vício em drogas". Mas as coisas, claro, não são tão simples. Em 1971, eu estava drogado, dirigindo uma Mercedes conversível, com minha mulher, grávida de sete meses, ao meu lado. Capotei três vezes. Na primeira, pensei: "Ai meu Deus, vou morrer!". Minha mulher quebrou a clavícula, mas felizmente nada de mais grave aconteceu.


O senhor diz que escrever a autobiografia VIDA foi mais difícil que gravar dez discos. Por que?
Foi complicado reviver tudo o que aconteceu comigo nesses 66 anos. Não pelos dissabores. Todo mundo passa por eles e os resolve como pode. O que doeu foi perceber o quanto errei e, acima de tudo, ver que não posso consertar muitos dos meus erros. É claro que todo ser humano tem essa sensação uma hora ou outra na vida - mas convenhamos que minha vida foi mais agitada que a da média das pessoas.


É verdade que o senhor ligava para sua mãe pelo menos uma vez por semana?
Sim. É verdade. Pela minha cara não daria para adivinhar, mas família é muito importante para mim - mesmo que eu passe semanas ou meses longe de casa em turnê. Minha mãe nunca me deu conselhos ou me repreendeu por meu estilo de vida, mas ela tinha certo jeito de olhar que era pior do que qualquer bronca. Mamãe significava também música para mim. Ela estava sempre ouvindo rádio ou LPs antigos. Pouco antes de ela morrer, fui visitá-la no hospital com meu violão e toquei Malagueña, que era uma das suas canções preferidas. Seu comentário para o resto da família foi: "Keith veio aqui e tocou para mim. mas que violãozinho desafinado!".


Keith Richards foi escoteiro. Isso é lenda, não?
É verdade também. Mas, para ser sincero, decidi ser escoteiro só para poder andar com uma faca. Acabei sendo um ótimo escoteiro. Fui líder de patrulha. Como treinamento para os Stones, foi muito bom, por mais incrível que pareça. No rock, é preciso se misturar a um bando de homens, e a camaradagem tem seu valor. Saí dos escoteiros por que me envolvi em uma briga, mas ainda trago a corporação no sangue. Outro dia vi o líder de uma tropa na televisão e fiz questão de me levantar do sofá e fazer a saudação dos escoteiros.


O.k., corta. Avanço rápido. Dizem que o senhor deu duas opções a um ex-traficante que se meteu a escrever um livro sobre os Stones; uma bala calibre 38 ou uma bala calibre 45...
Isso não é lenda, é a mais pura verdade. Esse sujeito, Tony Sanchez, andava com a gente nos anos 60 e 70. Certo dia, ele me procurou e disse: "Estou precisando de dinheiro e vou lançar um livro contando tudo o que a gente aprontou". O sujeito tem a coragem de me dizer isso? Então usei a única linguagem que essa gente entende. "Se você lançar o livro, morre com uma bala 38 ou 45", eu disse. Tony morreu antes de o livro ser publicado. Mas não fui eu quem o matou, juro. Até gostaria que ele estivesse vivo, para darmos umas boas risadas.


Foi uma boa ideia permitir que o seu filho Marlon acompanhasse as turnês do grupo desde bem pequeno?
Queria apresentar a vida na estrada ao meu filho. Ele me acompanha desde os 2 ou 3 anos. Conhece os músicos, as pessoas que montam o palco, todo mundo. Foi importante para ele descobrir como as coisas funcionavam nos Stones. Ele se tornou meu assistente. Marlon afastava os interesseiros e era a única pessoa que tinha o direito de me acordar. Eu estava cochilando no camarim e lá ia ele me dizer: "Papai, acorde que está na hora de fazer o show".


O senhor o aconselhou em relação as drogas?
Diretamente, não. mas Marlon cresceu no meio daquilo tudo. Hoje ele tem 41 anos e é uma das pessoas mais caretas que conheço. Não toma nenhum tipo de droga. Seria um exagero da minha parte dizer que fui um grande pai para Marlon, mas acho que fiz a coisa certa.



É verdade que o nome dele é uma homenagem a Marlon Brando, que, dizem, passou uma cantada dupla em Anita Pallenberg, sua ex-mulher, e no senhor?
Não. Achamos que era um nome bonito, e só isso. Marlon Brando era um babaca. Ele tinha aquela atitude típica de Hollywood, andava de nariz empinado,um esnobe. Como artista era fantástico. Mas, como ser humano, era horrível. Outro exemplo de como a fama pode estragar uma pessoa é Brian Jones (um dos integrantes originais dos Stones, encontrado morto por afogamento, na piscina de sua casa em 1969). Um dos músicos mais talentosos que já conheci, no começo ele era um sujeito doce, mas três semanas depois que os Stones estouraram, virou outra pessoa. Brian Jones passou a se achar o máximo, batia em mulheres e tinha crises de ciúme.


Na autobiografia, o senhor dá a entender que o órgão sexual de Mick Jagger é decepcionante. É fato?
Espere ai. Nunca vi nem quero ver o pênis de Mick. Muito menos dou crédito a essa história de que ele teria feito tratamentos eróticos para aumentar o tamanho do seu instrumento. O que acontece é que fiz uma piada comum em camarins de bandas de rock. Você chega para um amigo e diz: " Ah, o pequenino Mick, com suas coisinhas pequeninas". Foi só isso. Não apronto com Mick, por que ele não gosta. mas convenhamos que ele é material de primeira para piadas.


Como está o relacionamento de vocês?
Digamos assim, estamos conversando sobre uma possível volta dos Stones em 2011. Falta chamar o resto dos integrantes e colocá-los na estrada. Mick e eu somos amigos. Mais que amigos, somos irmãos. E, como acontece com irmãos que se amam, nosso relacionamento tem altos e baixos. Mick ficou iludido com a fama na década de 80. Deu prioridade a carreira solo em detrimento aos Stones. Isso me chateou bastante. Mas é passado. E, mesmo que não conversamos como antigamente, ainda nos damos bem. Uma banda de rock é uma coisa engraçada. A gente termina a turnê dizendo que está cansado e que nunca mais vai embarcar nessa. De repente, Mick me liga e pergunta se quero compor algo novo. Ou então (o baterista) Charlie Watts me telefona e diz: "Olhe, o que você acha de fazer uma turnê?". No fim, tudo da certo.


O senhor ficou chateado quando Mick Jagger foi eleito Cavaleiro do Império Britânico?
Por que ficaria? Não sou fã da monarquia. Nunca fui o sujeito que se ajoelha diante do rei - sou o cara que o ameaça com a espada. E, cá entre nós, fomos perseguidos por mais de trinta anos, considerados sujeitos antissociais, e agora dão um título de nobreza a Mick Jagger? Vou ter de chamá-lo do quê, Sir Mick ou de Lord Jagger?


Recentemente, sua mulher teve câncer. Como o senhor enfrentou a situação?
Patrícia foi diagnosticada com câncer de bexiga em 2007, no fim da Bigger Bang Tour. Quando eu recebi a notícia, disse para o médico: "Passe esse câncer para mim. Sou durão, tiro de letra". Ela se submeteu a várias sessões de quimioterapia e fez uma cirurgia para a retirada do tumor. Em todos os momentos, estive ao lado dela, por que, como já falei, dou muita importância às relações familiares. Hoje, Patrícia está curada.


Os Rolling Stones hoje são mais uma empresa do que uma banda de rock?
Banda-empresa? Depende do ponto de vista. A gente toca em estádios por que existe uma demanda imensa de ingressos para assistir aos Rolling Stones. Temos mega empresários e investigadores porque estamos cansado de ser roubados por empresários desonestos. Uma das pessoas que trabalharam na turnê dos Rolling Stones de 1980 comprou uma casa só com a grana que roubou de nós. Pessoalmente, eu me preocupo mais em tocar e fazer a banda vibrar do que com os investimentos da turnê. No máximo, dou palpites sobre as camisetas que serão vestidas. Aliás, nem ligo para o que visto no palco. Certo dia, Charlie Watts, com seus terninhos bem cortados, veio me provocar: "Keith, por que você insiste em subir no palco vestido com as roupas de sua mãe?". Eu não ligo.


Em VIDA, lê-se que You Don´t Have to Mean it foi composta na companhia de duas garotas de programa. Isso não é "tão" família, concorda?
De fato, eu contratei essas moças por que estava em busca de inspiração e pedi a colaboração delas. As meninas vieram, falaram de sua vida, disseram como gostariam de redecorar o quarto onde trabalhavam e dormiam tranquilamente. Nem encostei nelas. Nunca fui um conquistador. As mulheres é que sempre deram em cima de mim, não o contrário. os Stones vão sair em turnê em 2011, e quem sabe eu solicite o serviço de uma ou outra moça para me inspirar. Mas só para me inspirar.

O Rock seria possível sem drogas?
Se não existissem drogas, não existiria o rock ´n´roll. Isso é fato. Mas as drogas nunca foram o grande motor do rock. O que vale é a imaginação, o talento e a capacidade de criar letras memoráveis. As drogas não facilitam esse trabalho. Se elas fossem tão vitais para a criatividade quanto parecem, qualquer um faria rock de qualidade. Bastava usar cocaína aqui, heroína ali, e todo mundo teria um hit. é fato também que há um exagero total nesse encantamento com as drogas. Eu as usei durante décadas, usei por que quis e estou limpo desde 1977.

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Fonte: http://www.veja.com.br/

3 comentários:

  1. Keith é só risada.
    Acho que o papo dele e do John deve render muito. Imagine só esses dois conversando. Platéia ao delírio. rs
    Curti muito Ká. ;)

    Vida longa à Keith Richards. o/

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  2. A pessoa de Keith Richards é como sua guitarra e suas composições: impossível não se encantar!

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